A conclusão do Projeto para um novo CPC foi cercada de muita euforia e entusiasmo, mas esse sentimento parece estar diminuindo a passos largos.
Todos que trabalham com o Direito, tanto acadêmicos quanto profissionais, sabem que o problema da morosidade judicial não está ligado unicamente à legislação. É certo que em muitas situações o CPC não colabora com a duração razoável do processo, mas sua modificação ou substituição não fará com que o processo civil brasileiro seja célere. Esse problema tem raízes mais profundas, especialmente ligadas à falta de estrutura do Judiciário (que não consegue acompanhar em estrutura o desenvolvimetno da sociedade brasileira), à mentalidade demandista do brasileiro (aqui também incluídos advogados, juízes e integrantes do MP), dentre outros motivos.
As inúmeras reformas do CPC - desencadeadas a partir de 1994 - modernizaram sobremaneira nossa legislação, ao mesmo passo em que dificultaram a compreensão do Código enquanto sistema por criar uma "colcha de retalhos" em seu texto. Particularmente, tive a impressão de que em alguns casos faltariam letras do alfabeto para contemplar as modificações!
Essas alterações foram extremamente úteis, mas não causaram o efeito esperado, porque os problemas de fundo, aqueles que somente podem ser resolvidos com a mudança de mentalidade dos responsáveis pelas soluções, não foram atacados diretamente. Continuamos a ter um Judiciário lento, que não consegue ser eficiente.
A proposta de um Novo CPC foi encarada como a solução para todos os males - assim como o Biotônico Fontoura e a pomada Minâncora em outros tempos. Doce ilusão!
Ao contrário, pode ser um instrumento perigoso porque dá ao Judiciário ferramentas poderosas que, num cenário diferente, poderiam ser muito úteis à efetividade da prestação jurisdicional. Porém, na realidade brasileira, as condições de trabalho não permitirão ao Judiciário o exercício razoável de seus "novos" poderes. Um risco à segurança jurídica.
No último dia 20 de junho, num encontro realizado na FIESP, as cartas foram postas à mesa como ainda não haviam sido. Aliás, diga-se de passagem, uma reação típica da tradição brasileira, porque só vieram agora porque o CPC não foi aprovado em razão da lentidão do Congresso, que tem questões mais importantes para discutir, como o misterioso Código Florestal ou a briga pelo valor do salário mínimo. Nessa caso, a lentidão vai propiciar um debate tardio, mas importante.
Para não ser demasiadamente longo, sugiro a leitura da reportagem de Marília Scriboni, para o Consultor Jurídico (clique aqui).
Em síntese, finalmente alguém teve a coragem de dizer que o CPC não resolverá os problemas que hoje temos, dentre outras coisas, se a estrutura responsável pelo processo, por seu "impulso oficial" não for modernizada. Essa é uma constatação que Francesco Carnelutti já havia feito na metade do século XX:
“(...) Os interessados, ou seja, entre os técnicos do processo, juízes, advogados e partes, têm a consciência de que o mecanismo funciona mal. Esta consciência aflora ocasionalmente nos ambientes legislativos, mas quase nunca parece que houve outra coisa a fazer a não ser modificar as leis processuais, sobre as quais costuma-se colocar a responsabilidade do mau serviço judiciário, para empregar uma palavra que já entrou no uso corrente. Também ouvimos falar em reformas urgentes do Código de Procedimento Penal e do Código de Procedimento Civil, e todos parecem acreditar não apenas que com estas reformas o Estado tenha cumprido seu dever, como também que dessas reformas surgirão, Deus sabe como, melhorias na administração da justiça. Tenho o dever de desenganar o público a quem me dirijo, dissuadindo-o de cultivar estas que não seriam esperanças, mas verdadeiras ilusões. Certamente, nossas leis processuais não são perfeitas, mas, em primeiro lugar, são bastante menos más do que se diz; em segundo lugar, se bem que fossem muito melhores, as coisas não andariam melhor, pois o defeito está, muito mais do que nas leis, nos homens e nas coisas.”
Esse é um trecho da obra "Como se faz um processo", que versa sobre a realidade italiana . É uma obra composta de 15 capítulos e escrita em linguagem simples para o leigo. Foi uma compilação de vários programas de rádio que Carnelutti fez à época.
Aguardemos o desenrolar da discussão. O certo é que o conto de fadas já não é tão bonitinho!
Aguardemos o desenrolar da discussão. O certo é que o conto de fadas já não é tão bonitinho!
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