Três recentes decisões da Quarta Turma do STJ revelam quanto podem ser frágeis e variáveis os critérios para fixação do quantum em indenizações por danos morais. Numa delas, o Superior Tribunal de Justiça diminuiu a condenação anterior, noutra aumentou e numa terceira decisão, "incluiu" nos critérios para fixação do valor o número de lesados:
- STJ reduz indenização de R$ 60 para R$2 mil por devolução de cheque de R$ 300. Segundo a Quarta Turma, houve “evidente exagero ou manifesta irrisão na fixação, pelas instâncias ordinárias", violando os "princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, tornando possível, assim, a revisão da aludida quantificação.”O entendimento foi exarado no recurso do Banco do Brasil contra a decisão da Justiça mato-grossense que manteve o valor arbitrado na devolução de cheque de R$ 300 em indenização de R$ 60 mil. A decisão do STJ reduziu esse valor para R$ 2 mil.
O emitente do cheque ajuizou ação objetivando receber indenização por danos morais decorrentes de devolução de cheque por ser roubado, quando, em verdade, a devolução deveria ter sido por insuficiência de fundos. A anotação do banco no verso do cheque quando da devolução foi feita de forma equivocada, constituindo erro na prestação do serviço e causando danos a terceiros, no caso, devolver cheque sem fundos como se fosse roubado impõe a obrigação de reparação. O pedido foi julgado procedente pelo Juízo monocrático que condenou o Banco do Brasil ao pagamento de R$ 60 mil como indenização por danos morais. Segundo o TJ-MT, a sentença condenatória não mereceu reparos porque fixou o valor da condenação tendo, por base, o grau de culpa, a repercussão do dano, o potencial econômico das partes. Assim, negou provimento ao recurso do banco.
Mas o STJ examinou e acolheu demanda recursal do banco, pois já firmou o entendimento de que a alteração no valor de indenização por danos morais somente pode ser realizada em sede de recurso especial, quando o valor definido pelo Tribunal de origem se revelar irrisório ou exorbitante.
- STJ aumenta indenização à família de mulher que morreu após ser revistada em supermercado. Durante uma revista no supermercado Hiper-Líder, no Pará, Rejane Maria Silva Bezerra teve os pontos de uma cirurgia rompidos e morreu algum tempo depois, devido a uma infecção. A Quarta Turma do STJ decidiu, por unanimidade, que a empresa deve ser responsabilizada e tem de indenizar a família dela. Em junho de 1995, Rejane foi acusada de furto por uma funcionária e levada juntamente com os filhos e a sogra para um local reservado. Lá uma funcionária do supermercado a revistou, o que provocou o rompimento de pontos cirúrgicos que sustentavam uma sonda abdominal – cujo volume causou o engano da segurança da loja – usada pela vítima devido a uma cirurgia a que havia se submetido. Posteriormente, Rejane teve grave infecção, vindo a falecer em agosto do mesmo ano. Segundo relatos de outros clientes do estabelecimento, ela também teria sido humilhada, chamada de “ladra” e “safada”. O marido e os filhos ingressaram na Justiça, pedindo indenização por danos morais e materiais, com base no artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal. Também fundamentaram a solicitação nos artigos 6º, 12 e 34 do Código de Defesa do Consumidor, que obrigam os fornecedores de serviços e seus contratados e representantes a garantir a qualidade e segurança para o consumidor. A família exigiu, ainda, o ressarcimento das despesas médicas e do funeral e por lucros cessantes – já que Rejane tinha um pequeno negócio de confecções – e o pagamento de pensão para os filhos, menores, da vítima.
Em primeira instância, a ação foi julgada procedente, sendo fixada em 3,6 mil salários mínimos. Ambas as partes apelaram. O supermercado, contestando que a obrigação de pagar os honorários não tivesse sido partilhada, já que os familiares conseguiram apenas parte do que havia sido pedido. A família, questionando que somente o pedido de danos morais tenha sido aceito e os demais rejeitados. O Tribunal de Justiça do Pará acabou reformando a sentença para incluir também as despesas com funeral e uma pensão alimentícia de um salário mínimo para cada filho até que eles completassem 21 anos, mas negou o ressarcimento das despesas com remédios e com as internações. Os desembargadores reduziram a indenização devida pelo supermercado para 300 salários mínimos. Diante da decisão, ambas as partes interpuseram recurso especial ao STJ. A família de Rejane insistiu no pedido de ressarcimento dos remédios e despesas médicas e afirmou que a decisão do tribunal foi diferente do pedido, já que foi arbitrada uma quantia certa para a indenização e não o lucro cessante.
Em seu voto, o relator, ministro Aldir Passarinho afastou os argumentos apresentados pelo supermercado. Considerou que rever as despesas de funeral, o nexo de causalidade entre a morte de Rejane e o dano moral causado ao estabelecimento comercial com as publicações jornalísticas exigiriam análise de provas, o que é vedado pela súmula 7 do STJ. Em relação ao recurso da família da vítima, o ministro concordou que a decisão da Justiça paraense deveria ser modificada. Segundo explica, não cabe a fixação da indenização com base no Código Brasileiro de Telecomunicações, além disso há a circunstância peculiar de o fato ter ocorrido em decorrência de ato abusivo de funcionário do estabelecimento, que, além de se equivocar ao atribuir um possível furto à cliente que não o praticou, ainda realizou revista de forma abrupta, o que acarretou o agravamento do já muito precário estado de saúde da vítima, que faleceu algum tempo depois. Assim, aumentou o valor da indenização de 300 salários mínimos para R$ 280 mil (atualizáveis a partir do julgamento pelo STJ).
- Número de lesados passa a ser considerado critério para fixar indenização por dano moral. A Quarta Turma do STJ manteve a decisão do TJ-RJ que condenou a Petrobrás ao pagamento de 500 salários mínimos para cada um dos autores da ação, pais de vítima de acidente ocorrido na plataforma de petróleo da Petrobrás em 1984, em Macaé (RJ). A decisão representa mudança de entendimento do colegiado. A Turma, por maioria, acompanhou o entendimento do ministro Jorge Scartezzini, que norteou a sua decisão observando os princípios da isonomia, da razoabilidade e da proporcionalidade. O ministro destaca “a observância da eqüidade, das regras de experiência e bom senso e dos princípios da isonomia, razoabilidade e proporcionalidade quando da fixação da reparação de danos morais não se coaduna com o desprezo do número de lesados pela morte de parente”. A Petrobrás recorreu ao STJ contra a decisão do TJ/RJ que a condenou ao pagamento de 500 salários mínimos a cada um dos pais de vítima do acidente ocorrido na plataforma de petróleo. Inconformada com a decisão, a empresa alega que o valor estabelecido para a indenização por danos morais é exorbitante e caracteriza enriquecimento sem causa dos pais da vítima, bem como que há falta de legitimidade deles para requerer a indenização.
Consta dos autos que o óbito de Edson Rodrigues Simões, filho de José Rodrigues Simões Júnior, foi decorrente de acidente ocorrido com a queda de baleeira ao mar, que ocasionou a morte de 36 ocupantes. Foi constatado que a causa do acidente foi a negligência da Petrobrás na manutenção, bem como na falta de treinamento para abandono da plataforma e de pessoal marítimo capacitado para avaliar o estado do material e dos equipamentos, principalmente os de acionamento do sistema de liberação da baleeira antes da descida.
Ao analisar o recurso, o ministro Jorge Scartezzini ponderou que, ante as peculiaridades do caso, a manutenção do valor da indenização arbitrado pelo TJ-RJ, de 500 salários mínimos para cada um dos autores, pais, denota eqüidade e moderação, não implicando enriquecimento sem causa. O ministro entende que, quanto aos parâmetros usualmente considerados à aferição do excesso ou insuficiência no arbitramento do quantum indenizatório de danos morais - gravidade e repercussão da lesão, grau de culpa do ofensor, nível socioeconômico das partes -, faz-se imprescindível somar o número de lesados, a quantidade de integrantes envolvidos no pedido.
Fonte: Sala de Notícias do STJ